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Teresina joga no lixo todos os dias 120 mil metros cúbicos de biogás. Essa nuvem de gás tóxico é produzida durante a fermentação das 600 toneladas de resíduos orgânico que diariamente são despejadas no aterro sanitário. Se fosse tratado, esse gás poderia produzir energia do lixo, em vez de poluir a atmosfera e contribuir com o aquecimento global.

O teresinense está cansado de esperar o cumprimento de prazos que vão se exaurindo, promessas que caem no esquecimento e de ver sua cidade suja e maltratada. Vou puxar pela memória alguns problemas mais recentes.

O Tribunal de Contas do Estado do Piauí mandou suspender em março passado uma licitação para contratar a empresa que cuidaria do lixo. O valor do negócio: R$ 1,9 bilhão de reais!

O Ministério Público de contas apontou uma série de irregularidades no processo: superfaturamento, direcionamento e exigências indevidas de certificação. Tudo isso para dar de presente ao “vencedor” um orçamento 82% maior do que o do ano passado.

As suspeitas são muito graves. Elas nos mostram mais uma evidência do caos que reina na administração do lixo. Há problemas velhos e novos se acumulando pela cidade. A qualidade dos serviços prestados à população é sofrível. A cidade está imunda.

Um ano atrás, os 1.700 terceirizados do Consórcio Teresina Ambiental cruzaram os braços nas ruas, praças e cemitérios da cidade. A empresa, que atrasava frequentemente os salários, alegou que não podia pagar a folha porque a Prefeitura lhe aplicou um calote de R$ 122 milhões.

As pessoas reclamam, com muita razão, da sujeira que vai se acumulando e da longevidade do problema, que a Prefeitura não consegue resolver. Especialmente o descarte irregular de lixo. Parte da população realmente não colabora — fico aqui me perguntando se isso não se deve à falta de estímulos e exemplos da necessidade de mudar comportamentos que já não cabem mais no nosso tempo.

Ainda quando consegue coletar o lixo, a Prefeitura não está nem um pouco preocupada com os problemas ambientais criados pelo aterro sanitário: a contaminação do lençol freático, a proliferação de aves e especialmente a poluição gerada com a decomposição do lixo.

A metabolização da matéria orgânica é feita por bactérias. A decomposição gera enormes quantidades de gás metano, que provoca 25 vezes mais efeito estufa do que o dióxido de carbono (CO2). Esse gás chega à atmosfera e suas moléculas passam a acumular calor.

Já bem entrada no séc. XXI, Teresina deveria estar executando um planejamento ambiental compatível com o nível de emergência climática que estamos enfrentando. Mas sequer temos um esboço do planejamento, pois a administração do município é ideologicamente velha, arcaica e incompetente.

Por este motivo, situados na fronteira entre a Amazônia, o cerrado e a caatinga, não estamos conseguindo fazer jus às responsabilidades decorrentes da nossa posição geográfica privilegiada. Dois terços do esgoto deTeresina, por exemplo, ainda são despejados in natura nos leitos dos nossos rios.

Todos os dias a cidade produz cerca de mil toneladas de lixo. 60% são compostos orgânicos. Entregue à digestão das bactérias, cada tonelada de lixo orgânico gera em média 200 metros cúbicos de metano.

Com as 600 toneladas de detritos orgânicos diários, o aterro sanitário produz 120.000 metros cúbicos de gás a cada 24 horas. Se, em vez de dispersar na atmosfera, esse metano fosse coletado e convertido em eletricidade, seria possível gerar 12,5 MWh por mês, energia suficiente para iluminar cerca de 200 residências populares.

Se você acha esse número é pequeno, saiba que a geração de energia não é o único nem o maior ganho. Ao longo do processo de geração, a reação química que ocorre na queima do metano o transforma em CO2 e água, o que reduz drasticamente o impacto ambiental.

Com o dinheiro gerado pela produção da energia, a cidade poderia cuidar de outros problemas que necessitam de uma intervenção urgente. E ainda temos que começar a estruturar nosso futuro, pois esse importante trabalho de planejar, como afirmei antes, nem começou.

Quem diz que tudo isso é sonho, ou está mal informado, ou está completamente alienado. Você sabia que há alguns países que compram lixo para gerar energia? A Suécia e a Noruega, por exemplo, disputam ferrenhamente o mercado de lixo europeu. Em Oslo, a capital da Noruega, todo o sistema de aquecimento é alimentado por uma usina que gera energia térmica incinerando lixo estrangeiro.

Usina gera eletricidade e calor para aquecer a capital da Noruega
Usina em Oslo: eletricidade gerada por lixo comprado de outros países

E nós, aqui, olhando os monturos de detritos que crescem nas ruas e terrenos baldios de uma cidade que parece não ter se dado conta da necessidade de mudar certos paradigmas — especialmente nos campos ambiental e político.

Apesar de todos os problemas, nós podemos rapidamente vencer a inércia histórica e levar Teresina a uma condição de liderança global. As deficiências dos serviços públicos e a falta de qualificação dos dirigentes nos conduziram a um tal estado de atraso, que agora não nos resta alternativa a não ser fazer a capital piauiense avançar.

Na semana passada, divulguei no meu site o primeiro esboço da proposta que denominei de Teresina, Capital Verde. O processo começa com o aproveitamento dessa riqueza que a natureza nos deu de forma tão generosa — o Sol.

Temos 2.500 horas de insolação por ano nesta latitude. Criando pequenas centrais de geração de eletricidade fotovoltaica, a energia que vem da luz e a que vem do lixo serão suficientes para sustentar a iluminação pública e boa parte do consumo dos próprios municipais.

De quebra, ao reduzir a poluição ambiental, credenciaremos o município a ingressar no mercado dos créditos de carbono, que deve gerar os maiores ativos econômicos da segunda metade do século. Isso nos fará sair da rabeira do atraso para ocupar uma posição de vanguarda.

Teresina será vista e respeitada pelo mundo. Não pelo estereótipo do calor abrasivo, mas pelo uso inovador, respeitoso, ético e correto dos insumos que a tecnologia colocou à nossa disposição para progredir e proteger o meio ambiente.

Mas para que isso tudo comece a acontecer, abrindo um círculo histórico virtuoso, a cidade vai ter que vencer o desafio de dar à política a seriedade que ela merece. Só elegendo pessoas honestas, competentes e verdadeiramente interessadas em melhorar a vida da população conseguiremos sair do atoleiro do passado e rumar em direção ao futuro.

O eleitor tem que ir para a urna consciente de que com o voto não se brinca. Que a escolha feita a cada eleição vai definir como serão os quatro próximos anos das nossas vidas. Todos os problemas graves que nos afetam hoje são consequências das escolhas questionáveis feitas pelos eleitores no passado recente.

Pois que os erros e o sofrimento acumulados ao longo dos últimos 3 anos e meio nos sirvam de lição e incentivo.

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